Não sou muito achegado a redundâncias, mas preciso me recordar sempre, de que, as coisas inesperadas acontecem nos momentos em que menos esperamos. Gols caprichados de azar, tropeções na passarela, camisinhas estouradas e desarranjos intestinais. Todos estes momentos ricos de significado, que nem sempre conseguimos aproveitar. Mas deveríamos.

Uma dessas situações surpresa que me acontecem frequentemente, é a do desabafo alheio, o confessionário, o pedido de conselhos. Para o poeta, é uma pausa de conexão rica com o outro. Para o amigo que quer presentear o outro com o melhor conselho, uma responsabilidade inadiável. E para o amigo poeta, um bom motivo para escrever e, dar ao conselho, a maior longevidade possível, com a vida da poesia.

Muitos textos que produzo, são de fato, conselhos, mas nem sempre endereçados, ou melhor, nem sempre para um só destinatário. Outros, porém, são definitivamente pensados para algo ou pessoa, com carga de conselhos e vida, às vezes até em criptografia: só a pessoa entende.

Eis então, um desses momentos de conexão e poesia. Um recado bem dado e pra sempre:

 

 A vergonha de ser feliz

A vida é um catado de amores
Falidos, magros e manjados
Iguaizinhos àqueles cadelos
Que dormem nas calçadas
Das ruas que não tem flores

É uma ceia traída de sabores
Com vinhos e pães passados
E uns treze cabras sentados
Conversando sobre o destino
De quem amou aos próprios acusadores

Uma discoteca e seus singles irônicos
E as trilhas arranhadas repetindo
Quantas vezes não se quer ouvir
O som dos corações atônitos

A vida é uma montanha de velhos
Ensinando quase sempre a mesma lição:
Não adianta ser entregue ao amor
Se dele não vier a sinceridade da paixão!