Altos salários, hotéis cinco estrelas, prêmios, reconhecimento e destaque na mídia. Essa não é a realidade das jogadoras de futebol feminino no Brasil . Diferentemente dos homens que jogam a Série A, tratados como estrelas, nem aquelas que já ganharam títulos importantes possuem contratos elevados ou podem dispensar um outro emprego. O programa Caminhos da Reportagem, da TV Brasil, mostra que só mesmo muito amor mantém essas atletas no esporte.
“O que nos move é a vontade de estar ali, não o sonho de ser rica”, revela Thaís Prioli, jogadora do Guarani. Essa é a opinião não só de quem está no começo de carreira, mas também da experiente Marta, eleita por cinco vezes seguidas a melhor do mundo pela Fifa. “Não tem como ficar no patamar do masculino, mas queremos nos dedicar ao futebol, como profissionais . A maioria [das jogadoras] tem outro trabalho”.
A especialista em psicologia do esporte da Universidade de São Paulo, Kátia Rubio, afirma que recebeu da presidenta Dilma Rousseff a recomendação para garantir um cuidado especial com o futebol feminino. “Até conseguir convite para jogar no exterior elas precisam de muita força de vontade para superar os problemas. Se alimentam mal, são mal alojadas, não têm salário decente e muitas desistem sem vislumbrar futuro”.
Sem comparação com os homens
A jogadora Mayara Bordin, 27 anos – atualmente no time do Adeco (SP) – avalia que o modelo construído no futebol masculino não deve ser perseguido pelo feminino. “Acho que não tem necessidade de chegar no jeito que eles estão, estamos vendo onde os clubes estão chegando, se atolando em dívidas. Mas a gente também não precisa viver do jeito que vive”, avaliou.
Mayara lamenta que os salários ou a ajuda de custo das jogadoras não cheguem a 1% do total recebido pelos homens. O Adeco – time do Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa, equipamento da prefeitura de São Paulo para esporte de alto rendimento – foi o campeão do Brasileirão feminino em 2013.
A jogadora lembra que essas disparidades não ocorrem apenas no futebol. “Em todos os campos de trabalho, há diferenças muito grandes em termos de salário, condições”, lamentou.
Como funciona no exterior
Quem está no ramo sabe que o futebol feminino brasileiro ainda está muito distante de outros países. A técnica do São José (equipe que foi a primeira campeã do mundo), Emily Lima, lembra que na Espanha o calendário do campeonato feminino acompanha o do masculino.
A goleira Thaís Picarte, por sua vez, critica a falta de atenção e de planejamento por parte da CBF. “No Japão, os investimentos começaram 10 anos antes. No Brasil, apenas há seis meses. Ninguém pode achar que se investiu demais”.
Sem lugar para treinar
A menos de duas semanas do Campeonato Brasileiro de Futebol Feminino, que começou em 7 de setembro, essa era a situação do time maranhense Esporte Clube Viana que completou duas décadas este ano. Viturino Santos, presidente do clube, conta que tem dificuldades para conseguir recursos para viabilizar o treino do time.
Para o aluguel do campo de futebol, ele precisava de R$ 150 (para duas horas). Para custeio da passagem das jogadoras, mais R$ 120, a cada treino. “A gente faz das tripas coração para fazer o futebol feminino. É uma dificuldade danada. A gente tira do bolso mesmo para poder fazer”, lamentou. Diante das dificuldades, não há uma regularidade nos treinos. “A gente treina um dia e passa quatro sem”, relatou.
Viturino conta que o Viana, que é originário do município de mesmo nome, a 230 km de São Luís, precisou mudar sua sede para a capital para viabilizar a participação das jogadoras. “Estamos em São Luís mesmo, porque as meninas são daqui. Em 2011, tivemos apoio [da prefeitura de Viana] e contratamos até jogadoras de outros estados”, lembrou.
Neymar “bancaria sozinho” o futebol feminino
A falta de viabilidade econômica do futebol feminino é um dos problemas apontados pelo coordenador do futebol feminino da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Marco Aurélio Cunha. “A divulgação é mínima porque o reflexo publicitário é mínimo”, pondera.
“O Neymar, com seus 18 patrocinadores, bancaria sozinho todo o futebol feminino”, compara Marco Aurelio. Já para o atual técnico da seleção feminina, o problema não está na CBF, mas no “todo”, incluindo os incentivos “dos municípios e dos estados”, conclui Vadão.
*EBC