Ao completar duas décadas de existência, o Cine PE, Festival Audiovisual de Pernambuco que une produções nacionais de grande orçamento e obras independentes, foi aberto na segunda-feira, 02 de maio, no cinema São Luiz, edificação histórica do Recife, com as primeiras exibições de mostras competitivas abertas ao público.
O evento vai de até o dia 8 deste mês. São três mostras de competição: uma de curtas metragens pernambucanos; uma de curtas nacionais e a competição entre longas-metragens de todo o país. São ao todo 24 premiações e os melhores de cada categoria recebem o troféu Calunga. Debates e workshops também entram na programação.
De acordo com o diretor do Cine PE, Alfredo Bertini, o critério para a escolha das obras foi de “máxima pluralidade. Você vai ver filme extremamente experimental, outro com proposta mais comercial e tem filme infantil”.
Este ano, além da comemoração dos 20 anos do festival, uma novidade é a composição das mostras somente por filmes brasileiros, ao contrário de edições anteriores. “Daqueles [filmes estrangeiros] que poderiam ser selecionados existiam projetos nacionais tão ou mais interessantes. Foi levada em conta também a questão cambial e as dificuldades para trazer gente de fora. É um investimento relativamente alto e, dentro de um quadro de crise e dificuldades de patrocínio, ficou inviável este ano. Por isso, resolvemos privilegiar o cinema brasileiro”, conta Alfredo
O primeiro filme da mostra competitiva de longas metragens é Por Trás do Céu, de Caio Sóh, rodado em 2014 e exibido pela primeira vez nesta segunda-feira. A sinopse indica que a história se passa em um lugar “esquecido por Deus, assolado pela pobreza e pela falta de mínimas condições básicas”. É nesse local que se desenrolam os sonhos de Aparecida, a protagonista representada por Nathalia Dill. “É um dos festivais mais legais do Brasil, e é uma honra participar. O filme é muito lúdico, muito poético, combina muito com esse festival”, comenta a atriz, que vem pela segunda vez ao Cine PE. A primeira foi com Paraísos Artificiais.
Nesta edição, dois profissionais são homenageados: a cineasta Carla Camurati e o ator Jonas Bloch. Ele recebe a honraria neste primeiro dia de festival. Com várias novelas no currículo e mais de 40 trabalhos realizados, dos quais ele contabiliza pelo menos oito que passaram pelo Cine PE, Bloch falou da importância dos festivais para o audiovisual no país. “O festival começa a fazer um boca a boca, faz um congraçamento de todas as pessoas, discute o cinema brasileiro em workshops, ou seja, repensa o que está sendo feito, tem toda uma vitalidade, uma movimentação que só faz bem para o cinema brasileiro”, avalia.
Jonas Bloch também falou do atual momento do cinema nacional. “Teve uma época que os diretores, de um modo geral, queriam todos ‘cabeça’. Chega uma hora que se começou a pensar de outra maneira. Não tem só um tipo de filme, tem comédia, drama, experimentais e uma infinidade de curtas metragens. Isso significa muito, os cursos de cinema se proliferaram pelas universidades. É outro Brasil, outro cinema brasileiro. Ele tem uma vitalidade, uma diversidade que é muito importante hoje”, elogia, embora critique o papel dos exibidores nesse contexto.
“Estamos produzindo cada vez mais e alguns filmes conseguem bater os filmes americanos. O problema é que tem uma jogadinha por fora, de alguns exibidores. Você quer ver filme brasileiro, não consegue, tem que ir lá longe. Na Barra [Rio de Janeiro], por exemplo, todos os cinemas exibem o mesmo filme, e o brasileiro está lá no ‘bairrozinho’”.
O festival atrai gente como Regina Lopes, 43. A assistente oftalmológica não pisava em uma sala de cinema há mais de um ano. Fruto da facilidade de assinaturas de programas e compra de DVDs, diz: “Vim pela curiosidade, ver um filme pela primeira vez e ver os atores”.
Grandes produções dividem espaço com filmes de menor orçamento, de realizadores independentes. A obra que abriu o festival, por exemplo, foi dirigido por uma jovem de 22 anos. Não tem só mandacaru, um documentário sobre a poesia de São José do Egito, município pernambucano, é o segundo da carreira de Tauana Uchôa. Além de inaugurar o telão do Cine PE, ela conseguiu ter não um, mas dois curtas selecionados para a mostra competitiva – o outro é uma ficção, A vida em uma viagem.
Em seu rápido discurso, Tauana agradeceu a diversidade cultural de Pernambuco. “A cultura rica do estado me presenteou com esse filme”. Mais cedo, a pernambucana falou sobre críticas feita pela Associação Pernambucana de Cineastas, de que o Cine PE favoreceria títulos comerciais e não fortaleceria o mercado local.
“Os festivais como um todo, não só o Cine PE, são, sim, uma porta para que alguns realizadores tenham espaço. A questão de ter mais ou menos espaço, quando o festival é local, acho que é uma coisa que vai ser discutida por muito tempo ainda. Quem sou eu para dar uma resposta definitiva. Mas acho que ele tem sua importância”, argumentou.
A Associação Brasileira de Documentaristas e Curtas-metragistas de Pernambuco, divulgou carta aberta no fim de abril informando que não aceitaria o convite para participar do júri do festival. Eles questionam o modelo de financiamento do Cine PE e a desigualdade de pagamento entre artistas famosos e profissionais locais. Os produtores responderam, em nota, a posição das organizações. “Nós respeitamos e vamos continuar sempre os convocando para participar do festival. Por princípios democráticos, fazemos questão de respeitar os pontos de vista, porque compreendemos a pluralidade do setor”, diz um trecho.
Os ingressos custam R$ 5 para todo o público. A programação completa está na página do cine PE na internet.