Era o cair da noite de uma sexta-feira, lá pros idos de 1999. O cenário? A sinuosa Estrada Velha do Aeroporto, em Salvador, ornada por penhascos e vegetação verde que, nas proximidades das Cajazeiras, mais lembrava um caminho para o interior do estado…
A única coisa que dava pra ver, àquela altura, eram mãos firmes e amontoadas se segurando na base de alumínio, suspensa no teto do buzú lotado, típica muvuca…
De repente, um tipo insólito agarrou-se à porta traseira – e fechada -, sob o olhar misto de reprovação e apreensão dos usuários daquele transporte, parecia que iria rolar um ‘miserê’…
Ele, o figura, cantarolava refrãos de Edson Gomes – “sou camelô, sou do mercado informal…” -, alheio a toda a preocupação dos passageiros.
Algumas senhoras já ensaiavam pedir ao motorista para parar, temendo a queda iminente daquele rapaz dependurado, sendo jogado para um lado e para o outro, nas curvas da “EVA”, quando ele disparou a frase que se imortalizou na memória dos presentes naquela condução…
– Bora motô, encosta mais no mato que é ‘preu’ limpar meus ‘táaartos’ [mostrando os dentes podres]!…
O ‘público’ veio abaixo, às gargalhadas!
Dicionário do ‘baianês’:
Buzú: ônibus
Muvuca: concentração desordenada de pessoas
Miserê: algum problema grave, uma fatalidade / Se adequa também, em outros contextos, a um homem destemido
Figura: pessoa de comportamento incomum
Camelô: vendedor ambulante
EVA: Estrada Velha do Aeroporto
Motô: motorista
Preu: para eu
Táaartos: tártaros