Você percebe que está ficando velho quando uns gurizinhos jogam futebol na rua e a bola vem em sua direção. Um deles grita (para o bairro todo ouvir):

– Chuta a bola aí, tio!!!

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Tio??? Penso eu, nas rápidas frações de segundos entre a chegada da bola aos meus pés. A rua para a fim de ver minha reação. Minha vontade-raiva é a de incorporar um Ronaldinho Gaúcho e sair ‘dibrando’ cada um desses demoniozinhos ousados.

A bola rola caprichosamente por meio do asfalto irregular da rua e vem ao meu encontro. O dono do bar não pousa a garrafa de cerveja na mesa só para ver o lance. A roda de idosos que joga dominó adia a rodada para depois. O vendedor de peixe interrompe seu passo apressado. Do nada, viro o centro das atenções. Tenho que fazer algo. Eles esperam que saia algo de produtivo, curioso, um tombo meu talvez – um corpo estendido no chão, gargalhadas e mais gargalhadas.

Enfim, a bola chega aos meus pés. Desembesto a fazer embaixadinhas. O lado reacionário que há em mim calcula que, quantas mais eu fizer, mais tempo retardarei para devolver a bola ao guri que ousou me chamar de tio. Ora, vejam só, tio… No máximo, irmão mais velho. E olhem lá! Absurdo. Tio.

Em meio a minha suposta habilidade (vizinhança orgulhosa de mim), um outro guri, impaciente, solta outro grito:

– Devolve a bola aí, tio!!!

Rendo-me a torcida.