Foi um basta à “ditadura” da exploração do corpo da mulher na publicidade. De um lado, defensoras dos direitos da mulher, das mais distintas áreas [universidade, OAB, Defensoria Pública, Legislativo, Executivo, movimentos sociais], clamando por reação em massa. Do outro, publicitários e a tese de mercado, do lucro. No centro, um consenso necessário: “A mulher não pode ser tratada mais como mercadoria consumível”. Este foi o cenário do debate sobre o projeto de lei que proíbe o uso de imagens sexuais ou pornográficas em peças publicitárias na Bahia, realizado nesta quinta-feira (03), na Assembleia Legislativa.
“Este projeto não quer legislar sobre propaganda comercial, mas sim proteger interesses das mulheres que são tratadas como produto e das crianças que têm livre acesso a essas peças com forte apelo sexual. Ele é parte da nossa luta contra a violência à mulher”, destacou a autora da proposta, deputada Luiza Maia (PT). A parlamentar lançou a campanha “Basta! Não Somos Mercadoria”.
Na opinião de Américo Neto, vice-presidente da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap-Bahia), a publicidade não visa “vender” a imagem erotizada da mulher, mas o produto. Destacou, contudo, que a publicidade acompanha o sentimento da sociedade: “O poder está nas mãos do consumidor. Se o consumidor trocar de produto, a propaganda muda”.
Ele defendeu a legitimidade e importância do projeto de lei e disse que as empresas de publicidade evoluem com a sociedade. “Se o pensamento da população, que infelizmente é machista, evoluir, iremos nos adequar. Precisamos também ficar atentos para um movimento como este aqui, pois não queremos causar insatisfação no consumidor”, disse Neto.
“É impossível ter mudança com passividade. Precisamos reagir, e esta proposta fomenta isto. Se aparência fosse igual a essência, não precisaríamos de ciência. Não é decisão da mulher ser coisificada. Temos que tirar a ‘casca da ferida’. Vivemos um empobrecimento de criatividade inovadora das agências de publicidade”, refletiu Olívia Santana, secretária de Políticas para Mulheres do Estado.
Para a presidente da Comissão de Mulheres da OAB-BA, Andréa Marques, acabar com a desvalorização da mulher na publicidade é uma luta de vanguarda. “Precisamos mostrar para os machistas que também somos consumidoras”. Ela sugeriu uma Emenda, para que o poder público não permita o anúncio de publicidade com este teor em permissionários do serviço público – como ônibus e ferry boat.
“Com o rompimento da fronteira do que é público ou privado, perdemos as referências. Isso fez romper a fronteira do lícito e ilícito. Vivemos então o apelo à imagem e não ao conteúdo. Resultado: o corpo da mulher virou mercadoria consumível e descartável”, apontou a cientista política Mariângela Nascimento, pesquisadora da Ufba.
Já a defensora Pública Cristina Ulm, afirmou que a Defensoria Pública baiana vai participar ativamente da campanha pela aprovação do projeto de lei: “Não vamos aceitar mais esse desrespeito a nós mulheres”.
“Não devemos naturalizar essa agressão silenciosa na publicidade”, clamou a vereadora Professora Patrícia (PT-Camaçari). Na mesma linha, ativista Sandra Munhoz, do coletivo Mulher e Mídia, defendeu que a exposição da mulher em todos os meios de comunicação precisa ser repensada.
O advogado da Abap, Ermiro Neto, declarou que a entidade está “irmanada com qualquer manifestação em defesa dos direitos da mulher”. Ele informou que qualquer pessoa pode denunciar publicidades consideradas ofensivas no Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), entidade que tem como missão impedir a veiculação de propagandas que firam os direitos constitucionais.